terça-feira, 19 de outubro de 2010

IGREJINHA!

12.10.2010 – IGREJA DO RICHARD MEIER

Este post é dedicado ao Luiz e ao Ivan, que muito gentilmente me deram a dica, depois da palestra do Richard Meier na FAU. O post é grande mas vale a pena aos arquitetos!




Eu acordei mais ou menos cedo, e fui com o marcon no Uficcio Erasmus pagar uma viagem para uma cidade mais ou menos perto de Roma, a um pouco menos de 200Km daqui. Nós vamos para lá no dia 18, em uma sensacional e deliciosíssima festa do chocolate! Lembrando que peruggia é a cidade da fábrica dos chocolates Baci, então eu espero me empanturrar de chocolate e sair de lá rolando, ou eu espero me afogar em uma fonte de chocolate, e todas essas deliciosas coisas que envolvem chocolate!

O Marcon tava doente e voltou para casa, e eu resolvi ir até a igrejinha do Richard Meier que os meninos me deram a dica. Para ir: peguei uma linha de metrô, andei 2 estações. Fiz a baldeação mais terrível que o mundo já viu, e peguei outra linha de metrô e andei mais 15 estações. Chegando lá, andei mais uns 600 metros e peguei um ônibus e andei 9 paradas. Aí, eu esperei outro ônibus e andei mais 12 paradas até finalmente chegar na igrejinha, muito muito tempo depois (não sei quanto tempo foi, devia ter cronometrado).

Durante o caminho, eu fui reparando como o raio da igreja era longe, e como eu não devia conhecer nadinha de Roma. Por analogia, eu cheguei na lindíssima conclusão ( que eu já sabia, na verdade, mas agora foi o “cair da ficha”): eu não conheço nadinha de São Paulo. Sério, se eu não conheço nada de Roma e ela é pequenininha, imagina só o que eu conheço de São Paulo. Meu deus, a nossa cidade é idiotamente gigante!

Imaginem só, em população: Roma tem 2,5mi de habitantes, e são Paulo tem 11mi. Logo, somos mais que 4 vezes maiores que os nossos amiguinhos da pizza. Orra, acho que a gente devia dividir a são Paulo em 4 novas cidades, e talvez assim fosse mais fácil de governar.  Eu estou um pouco horrorizada com as proporções das coisas...

Deixando isso de lado, durante o caminho até a igreja, na parte que eu fiz de ônibus, deu para reparar como a periferia de Roma é cheia de parques e grandes praças bem cuidadas e cheias de carinho. Eu vi as pessoas do bairro cuidando das plantas, crianças brincando com os pais de bicicleta, casais de namorados, velinhos passeando, e todas essas coisas fofinhas em cada um desses pequenos lugares. Achei legal porque todos tem uma gostosa área de lazer, convívio e encontro bem pertinho da sua casa, o que torna a rua um lugar bem mais aconchegante e convidativo. Curti.

Outra coisa interessante é que estava na hora do almoço. Como todos sabem, aqui, no almoço, tudo fecha por 3 ou 4 horas, e as pessoas vão almoçar em casa. Como almoçar não leva todo esse tempo, sobra um tempinho para brincar com os filhos, passear com o cachorro, cuidar das plantinhas e tal. Acho que por isso, nesse horário, a rua estava deliciosamente povoada de pessoas simpáticas e cheias de felicidade. Definitivamente a gente tem que aprender a viver, e essa história de cesta é a idéia mais brilhante do século, hahahaha!

Finalmente chegando na igrejinha, depois da reflexão forçada sobre o mundo já que eu não tinha outra coisa para fazer... tcharraaaan! A igreja estava fechada! Eu aqui, idiotona, não parei para pensar que as pessoas da igreja também almoçam. Era 1h30 da tarde quando eu cheguei, e a igreja só abria as 15h30. E lá fui eu passear pelo entorno da igreja, desenhar, comer porcarias baratas que eu comprei no supermercado, ficar olhando a cor das árvores no outono e todas essas coisinhas, mas foi legal para ver como a hora de almoço pode acabar te gerando um momento legal que não tem nada a ver com esperar as coisas abrirem. 

Parque atrás da igreja

Mocinha com o seu cão no parque, no almoço!

A igreja mais parece uma loucurinha


Recuo? Iluminação? Hãn?


Durante a espera, eu fiz várias perguntas a mim mesma sobre a igreja, para ficar mais fácil de contar depois o que eu senti. Resolvi colocar direto as perguntas, e as respostas que eu pesquisei, assim é mais fácil e vocês podem pular se não quiserem ver.


De onde vem tanto mármore carrara?

“Dã, Gabi, sua tontinha. Carrara é uma zona na Toscana, aonde tem muito mármore. É uma formação geológica meio rara, então lá, as montanhas são de mármore carrara. Esse mármore é um dos mais belos e valorizados, e foi com ele que Michelângelo fez várias de suas esculturas. Em Roma tem tanto mármore, em tudo, porque ele existe em abundância na Itália, e também porque é um lance cultural, pois antigamente fazer imponentes construções de mármore demonstravam o poder e os avanços tecnológicos da sociedade, sacou? Aí, até hoje as construções usam esse mármore, como na Igrejinha do Richard Meier...”

“ Saquei, devia ter olhado no Google antes de perguntar...” (cara de idiota)


Porque essa igreja está aqui?

O panfletinho que estava na Igreja diz o  seguinte: ”A escolha de construir uma obra de arte na periferia romana representou para a cidade um sinal de revalorização arquitetônica de toda a área periférica, deixando certamente uma marca não apenas nos visitantes mas também na população do bairro.”

Bom, sei lá, eu sou brasileira. O bairro não tem nada de ruim arquitetonicamente, nem urbanisticamente ( o probleminha são só os motoristas que definitivamente não sabem o que significa “coletivo” na hora de estacionar e tal), comparado ao Brasil, que precise de uma revitalização, ou revalorização. Mas não sei, o padrão deles pode ser diferente, e esse bairro pode ser o piorzinho de todos, mas eu o considerei bem charmosinho. Meio perdidão no mapa, com várias áreas vazias, mas charmosinho. De qualquer forma, a igreja se encaixa na proposta de valorizar o bairro, porque ela realmente é um marco na paisagem, e certamente mudou a região.

Eu também não sei se colocar a igreja ali, quase como uma nova oferta de lazer ( tem quadra atrás da igreja, um parque linear ali do lado e tal), seja um incentivo para atrair novos fiéis. Eu acredito que Roma não precisa disso, mas vai saber. De qualquer forma, foi muito legal a iniciativa de colocar em um bairro normal uma construção com tanta tecnologia, e cheia de simbolismos. É quase como colocar cuidadosamente um delicioso morango todo bonitão no meio de um monte de batatas, é lógico que o morango vai chamar toda a atenção pra ele e vai dar uma valorizada nas batatas por tabela...


Porque 3 curvas e 1 reta?


As 3 "barcas", como ondas, "abraçando" as retas



Segundo o panfleto disponível na igreja, a forma da nave retoma a idéia de uma barca, a “barca de Pedro”. Na tredição cristã a Barca representa a Igreja como o povo de Deus, guiado por “Pedro”, o Papa. O panfletinho diz também o seguinte:

“ Esta igreja, desejada pelo Papa João Paulo II como recordação do Jubileu do ano 2000, devia representar a “barca da Igreja”, que sulca os mares do terceiro milênio. As três velas, que dominam da nave da capela ferial, simbolizam a Trindade e a vela maior quer dar a sensação da proteção de Deus sobre a Comunidade cristã. Com efeito, quer vertical, quer horizontalmente, o sol nunca entra diretamente na igreja, exceto em um particular momento da tarde, quando, de uma pequena janela colocada no alto atrás do presbitério, a sua luz ilumina do exterior o crucifixo colocado no interior”

Sobre essa coisa da luz, valeu a pena reparar nos pontos de iluminação artificial, que foram muito bem pensados, e também no rasgo que tem no chão, na vela pequenininha, que deixa a luz entrar na igreja na altura dos nossos pés. Super cênica a iluminação vinda desse rasgo, muito bonita. 



iluminação externa

Detalhe para a iluminação interna

iluminação artificial no piso, e natural ali do ladinho




Porque 5 sinos? Porque os sinos tem tamanhos diferentes? 






Também, segundo o panfleto:

“Os sinos, fundidos de modo artesanal na Pontifícia Fundição Marinelli de Agnone, são cinco  e em cada um deles estão evidenciados alguns elementos de caráter paroquial e de caráter universal: o primeiro sino, o maior, é dedicado à Europa e intitulado de Virgem Maria; ele contém o elenco de todos os Jubileus Ordinários desde 1300 até hoje e a data da primeira celebração paroquial. O segundo em ordem de grandeza é dedicado à América e intitulado São Pedro e São Paulo, patronos da cidade de Roma; contém, além disso, a bata do primeiro batismo na paróquia. O terceiro, sempre em ordem de grandeza, é dedicado à África e intitulado São Carlos Borromeu, em honra ao Papa João Paulo II, cujo nome de Batismo é Carlos; contém a data do primeiro funeral. O quarto sino é dedicado à Oceania e intitulado de São Cirilo de Alexandria e São Tomás de Aquino, em hora das paróquias às quais pertencia primeiro o território da nossa paróquia; contem a data do primeiro matrimônio. Por fim, o quinto sino é dedicado à Ásia e intitulado de São Francisco Xavier e Santa Teresa do menino Jesus, patronos das missões; contém a data da colocação da “primeira pedra” do complexo paroquial”

Dispensa maiores explicações. Para mim, está suficiente assim.


Porque a cruz é tão discreta? 


cincão para quem ver a cruz de primeira,
sem procurar nem um pouquinho



Não sei  nem se dá para reparar nas fotos, mas a cruz está lá. Não está no ponto mais alto, como é o comum, e não está nem na igreja: está ali, discreta, apoiada em um pilarzinho discretíssimo, no muro da igreja. Bom, eu não sei porque ela está ali, mas ela foi a última coisa que eu vi, de tudo. Não sei se o Richard Meier quis dizer alguma coisa com isso, mas acho que não, uma vez que realmente uma cruz ali no meio daquelas ondinhas ia ficar bem nada a ver. 

De qualquer forma ela é extremamente discreta e pode facilmente passar desapercebida.


De que forma a luz natural foi levada em consideração na composição da fachada?

Eu estava pensando na importância da luz no interior da igreja quando me fiz essa pergunta. Na verdade, eu não sei até que ponto a luz foi pensada na composição da “fachada” ( sei lá, acho que o termo está errado, a igreja meio que não tem “lados” para ter uma fachada, eu fiquei confusa...). Tudo no exterior é muito branco, a luz é bem refletida, e o vidro dá uma grande transparência, e gera uma leveza para quem está do lado de fora. Com os muros fechados, é como se a igreja “voasse”, porque é uma construção branca, reluzente, cheia de transparências; ela não parece nada com um volume seguramente preso ao solo.

Enfim, acho que a luz tem muita culpa nessa “brancura” de cegar os olhos e nessa leveza de duvidar da estrutura, mas não sei até que ponto ela foi determinante na forma da igreja. Acho que a forma foi feita para que a luz entrasse de uma forma teatral na nave da igreja, isso sim, e que o branco da parte externa, por si só, já dá essa idéia de leveza.


Porque as são curvas do lado direito da composição, e o lado esquerdo é rígido e ortogonal?

Tá, nessa pergunta eu fui meio begginer, mas eu não tive a sacada que a igreja são as 3 velas, e a parte mais à direita é o campanário, e que, apesar de interligadas, são duas coisas diferentes. O Richard Meier já previu que eu ia ser burrinha e deixou bem explícito que eram duas coisas diferentes, através da forma livre de uma e rígida da outra, mas eu não fui sensível suficiente para sacar de primeira. Até os sinos ficavam evidenciando a torre e tal, mas agora que eu li isso, em outro panfleto, tudo faz sentido.
Não tenho mais nada a acrescentar. Um é a igreja, o outro é o campanário, dã.


Porque diferentes materiais, do lado esquerdo e direito da igreja? Porque concreto, metal, mármore e madeira?

A mesma coisa da resposta anterior, dã. Não bastava a forma, o cara ainda usou materiais diferentes e mesmo assim eu não saquei na hora que uma coisa era a igreja, e a outra o campanário. Dã!

Espero que vocês tenham gostado! Aos que ainda não fizeram fadonas, o trabalho tá quase pronto aí já! Podem copiar!

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